7 dicas para contratos entre Influencers e Empresários

Sumário

Por Rafael Duarte e Alexandre Caputo*

 

Tudo começa com a publicação de vídeos na internet e, em pouco tempo, o conteúdo produzido já viralizou. Da mesma forma como muitas pessoas começam a consumir o conteúdo produzido por essas novas celebridades do mundo virtual (influenciadores digitais ou digital influencers), esse sucesso meteórico tende a atrair, também, interessados em agenciar e empresariar o influencer, prometendo cuidar de sua carreira. Para isso, é importante adotar todos os cuidados antes de assinar qualquer instrumento que possa, eventualmente, prever anuência com cláusulas potencialmente abusivas, ignorando o grande risco a que está submetido. 

O nome “influenciador digital” não foi cunhado por acaso. Serve para identificar pessoas que conseguem, sem sombra de dúvida, influenciar fortemente o comportamento de consumo de seus seguidores. Logo, a inserção por alguns segundos que sejam, em vídeos desses criadores de conteúdo virtual, de menções a produtos ou serviços de anunciantes pode representar também um efeito viral na assimilação desse produto/serviço dentre aqueles que acompanham o digital influencer.

A conclusão, então, é bastante simples: digital influencers são agentes econômicos com grande valor e o interesse de sua cooptação por empresas e/ou agentes de negócios (vulgos “empresários”) salta aos olhos, crescendo exponencialmente todos os dias. Justamente por conta desses fatores, a publicação de hoje conta com algumas recomendações jurídicas para que influenciadores digitais tenham a devida cautela na hora de assinarem contratos e se obrigarem perante agentes de negócios, especificamente, sob pena de se verem prejudicados, podendo perder não apenas dinheiro como prestígio no tão disputado meio virtual. 

Em síntese, todo cuidado é pouco

Situações como a vivenciada por Iran Ferreira acontecem todos os dias, em decorrência da conjugação de desinformação e ingenuidade. O menino nascido no interior da Bahia, na cidade de Quijingue, a 322 quilômetros de Salvador e atualmente considerado o influenciador de futebol mais seguido no Instagram e no Tiktok, com mais de 14 milhões de seguidores, ficou famoso mundialmente como “Luva de Pedreiro”. O nome Luva de Pedreiro faz referência às luvas utilizadas pelo jovem para jogar futebol. Ele se tornou uma sensação viral com o bordão ‘receba’, em vídeos de seus feitos em um campo de várzea da cidade onde nasceu. Esse é apenas mais um exemplo do que pode acontecer com influenciadores mal assessorados. Essa situação é potencializada quando o influenciador digital possui origens humildes, muitas vezes semi analfabeto ou sem instrução formal, mas com um potencial imenso e assina contratos sem respaldo jurídico.

Por óbvio, a dica introdutória (antes mesmo das 7 dicas) e fundamental é ler o contrato com o máximo de atenção. Porém, em diversos casos, o influenciador pode não ter instrução suficiente para entender as repercussões do conteúdo do contrato que está assinando. Por isso, é fundamental contar com assessoria jurídica especializada em contratos.

Superado esse ponto, seguem as 7 dicas fundamentais:

 

1) Remuneração: 

A recomendação consiste em prestar atenção na forma como o pagamento será realizado ao empresário, prestadores de serviços e parceiros. Isso será feito mediante a resposta aos seguintes questionamentos exemplificativos: todos os ganhos serão divididos? Qual é o percentual a que cada um terá direito? Mesmo que o influenciador consiga assinar um contrato sem intermediação do empresário, a remuneração será devida? 

É, logicamente, um ponto com claro viés negocial, mas não se recomenda que o influenciador receba menos do que 50% dos proveitos decorrentes do que produzir. Afinal, só há um conteúdo viralizado na internet, porque as ideias e a produção intelectual do influenciador floresceram. 

Além disso, sugere-se especial atenção quanto aos benefícios não pecuniários, tais como o custeio direto de uma residência para a família, uso de veículo, matrícula e mensalidades para complementação dos estudos do influenciador, entre outros. Havendo esses benefícios, o contrato precisa esclarecer qual será o contrato conferido a eles no caso de eventual extinção do contrato antes do prazo projetado, especificamente para o fim de afastar a obrigação de devolução do equivalente em dinheiro.

 

2) Exclusividade: 

Um dos pontos mais importantes nessas negociações recai sobre a existência ou não de exclusividade em favor daquele agente de negócios (empresário). Não há, necessariamente, qualquer impedimento a que seja garantida exclusividade àquele agente de negócios, mas o influenciador precisa trabalhar em seu favor esta questão no processo de negociação. Por exemplo, se o agente de negócios exigir exclusividade, em troca de o influenciador renunciar temporariamente ao direito de constituir diferentes agentes de negócio, o percentual devido ao empresário há de ser reduzido, visto que terá direito a participar de toda e qualquer receita gerada pelo influencer

Todas essas particularidades podem ser detalhadamente discutidas e negociadas caso o influenciador conte com assessoria jurídica especializada, de modo a oportunizar que seus direitos sejam devidamente resguardados, visto que, ao fim e ao cabo, há possível conflito de interesses na celebração do acordo entre influenciador e agente, cada um querendo ter as melhores condições em seu favor. 

 

3) Constituição de Pessoa Jurídica para maior proteção e otimização tributária: 

Como já destacamos em outras postagens, a constituição de pessoa jurídica própria para desenvolvimento de atividades econômicas (ex.: Sociedade Limitada Unipessoal) é uma alternativa muito recomendável, tanto em termos de proteção jurídica (separação entre patrimônio pessoal e da pessoa jurídica), quanto para fins de otimização tributária (estratégia de elisão fiscal lícita, para recolhimento da menor carga tributária possível dentre da lei). 

Dessa forma, o influenciador poderá produzir o conteúdo e anunciá-lo nas redes com a maior segurança possível, podendo focar-se de modo mais sossegado em produzir seus conteúdos e seguir crescendo no meio virtual.

 

4) Propriedade intelectual: 

É importante lembrar que o direito autoral moral sempre vai ser do influenciador. Porém, os direitos autorais patrimoniais podem ser cedidos para terceiros. Por isso, todo o cuidado é pouco nesse ponto, principalmente com relação à titularidade do conteúdo produzido e como ele será explorado comercialmente (campanhas publicitárias, por exemplo). Caso as partes acordem que os direitos autorais patrimoniais serão cedidos em favor do empresário, apenas este terá direito a explorar comercialmente essa produção, o que poderá, indiscutivelmente, gerar grandes dores de cabeça ao influencer.

 

5) Autonomia sobre a produção do conteúdo 

A ideia de autonomia em favor do influenciador deve ser entendida de duas formas principais. A primeira delas se refere à frequência de publicações e horário de trabalho; é simples: o influenciar não é empregado do seu agente de negócios (“empresário”). Ele deve ter resguardadas a sua plena autonomia e liberdade para desenvolver o conteúdo na frequência e da forma como entender mais adequado. Esse ponto é fundamental no momento da elaboração do contrato, para o fim de evitar que a redação do instrumento sirva para transformar o influencer em “refém” de seu agente. 

O segundo aspecto relevante em relação à autonomia do produtor de conteúdo está vinculado ao conteúdo em si. O influenciador constrói a sua imagem com base no conteúdo que produz, cativando determinado grupo de pessoas e, muitas vezes, o seu diferencial reside não no conteúdo que ele produz, mas acima de tudo, no conteúdo que ele não produz (ex.: recusa em produzir conteúdo que discrimine determinado grupo de pessoas). Caso o contrato seja redigido de modo a reduzir indevidamente a autonomia do influencer, haverá potencial espaço para que ele se veja compelido contratualmente a começar a atingir um público diferente, frustrar a confiança nele depositada por seu público cativo e até ir contra seus valores morais.

Essa decisão sempre deve competir ao influenciador, que é o rosto de toda postagem e publicação e, por conta disso, compromete-se diariamente com seus seguidores. Os efeitos de eventual “traição” de seus seguidores recairão sobre o influencer, então toda escolha sobre o conteúdo deve competir a ele mesmo. 

 

6) Respeito a regras publicitárias e do consumidor:

O respeito às regras publicitárias também é um resguardo adicional essencial para os influenciadores. O contrato precisa deixar muito claro que toda decisão sobre os conteúdos a serem produzidos e divulgados precisa, antes de tudo, respeitar regras relativas à publicidade. Dentre as abordagens feitas pelo influenciador nas redes sociais, está a possibilidade de divulgação de produtos ou serviços de terceiros. Ao fazer isso, a divulgação será direcionada a consumidores e, portanto, todo o arcabouço protetivo do Código de Defesa do Consumidor, bem como dos órgãos responsáveis por sua observância (SENACON, PROCON, Ministério Público, Delegacias do Consumidor etc.), há de ser respeitado. 

Da mesma forma, considerando que estará sendo realizado anúncio publicitário, o cuidado com as diretrizes fixadas pelo CONAR (Conselho de Autorregulamentação Publicitária) também precisa se fazer presente. Todos esses pontos hão de ser trabalhados conjuntamente pelo influenciador e seu “empresário”, concluindo-se que seus valores e princípios de trabalho estão alinhados. Principalmente, a preocupação de ambos deverá ser o respeito máximo aos seguidores, consumidores finais do conteúdo produzido pelo influenciador.

 

7) Multa pela extinção precoce do contrato:

É comum esse tipo de contrato prever multas pesadas, já que, numa fase inicial, seja frequente o empresário investir no influenciador, visando a ter resultados no futuro através da participação nas receitas com patrocínios, monetização em redes sociais etc. 

Como forma de atenuar os riscos decorrentes de uma cláusula de extinção contratual precoce, a imposição de sanção deve ser objeto de atenção diferenciada pelo influenciador na hora de assinar o contrato. Deve-se sempre negociar tendo em vista o fato de haver fixação legal de um teto máximo para imposição da chamada “cláusula penal compensatória”, ou seja, o valor que a parte inocente pelo fim do contrato terá direito a receber em virtude da frustração pelo fim antecipado do contrato. 

No caso, é possível que o influenciador não tenha mais interesse em contar com o suporte do seu “empresário”, a despeito de o contrato ainda estar vigente (ex.: contrato assinado por 10 anos e o influenciador decide romper após 2 anos de execução contratual). Se isso acontecer, essa compensação financeira a que o empresário terá direito a receber precisa ser muito bem pensada, para evitar que o influencer se torne refém do contrato e acabe se mantendo vinculado, por não deter condições econômicas de arcar com o valor total da multa.

Considerando que o art. 412 do Código Civil impede que a cláusula penal supere o valor da obrigação principal, uma potencial redação para essa cláusula é estabelecer um percentual sobre os resultados obtidos nos últimos 6 (seis) meses, por exemplo, prevendo parcelamento de seu pagamento (evitando que o influenciador sofra uma cobrança muito alta de uma hora para outra). Caso contrário, o empresário poderia argumentar que o “valor da obrigação principal” seria a parte dele sobre os resultados multiplicado por todos os meses até o fim do contrato, o que poderia atingir um valor estratosférico, “escapando”, em tese, do teto do art. 412 do Código Civil. Os cuidados com essa cláusula são essenciais e não podem escapar da visão do influenciador digital. 

 

*Rafael Duarte, Sócio do escritório Caputo Advogados, com atuação especializada em Empresas de Base Tecnológica e Startups. Pós-graduando em Direito Digital e Proteção de Dados; Pós-graduado em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul; Pós-graduado em Direito Negocial Imobiliário pela Escola Brasileira de Direito; Pós-Graduado Direito Imobiliário pela Faculdade Legale/SP; Pós-graduado em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale/SP; Mentor em programas de empreendedorismo e desenvolvimento de negócios inovadores, tais como Inovativa Brasil, entre outros; Membro da Comissão Direito Imobiliário da OAB/RS; Membro da Comissão de Direito Sucessório do IBDFAM/RS.

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Alexandre Caputo, Sócio do escritório Caputo Advogados, Diretor na Associação Gaúcha de Startups (AGS); Conselheiro na Associação de Afroempreendedores ODABÁ; Especialista em Direito Societário e Contratos Empresariais; Mentor em programas de empreendedorismo e desenvolvimento de negócios inovadores, tais como Inovativa Brasil, entre outros. Experiência de 10 anos na área empresarial, atuando para empresas em todo o Brasil.

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