*Por Bianca Gomes de Freitas
Introdução
No universo empresarial, a transferência de ativos e participações é uma prática frequentemente adotada para possibilitar o crescimento e a reestruturação das organizações.1 Entre os diversos instrumentos jurídicos disponíveis para essas finalidades, destacam-se o contrato de trespasse e o contrato de cessão de cotas.
Esses dois mecanismos apresentam características e implicações legais distintas que influenciam diretamente no processo de reestruturação das empresas, embora ambos envolvam a transferência de direitos,.
O contrato de trespasse refere-se à transferência de um estabelecimento comercial como um todo, incluindo bens corpóreos, quais sejam: bens móveis e imóveis; e os incorpóreos, que são: marcas, patentes e clientela.
Por outro lado, o contrato de cessão de cotas trata da transferência de participação societária, alterando a composição dos sócios de uma empresa.
Dada a relevância desses instrumentos no cenário empresarial, este artigo tem como objetivo aprofundar a compreensão sobre as particularidades de cada um, elucidando as diferenças entre o trespasse e a cessão de cotas. Analisaremos suas implicações legais e práticas, ressaltando aspectos que vão desde a responsabilidade dos envolvidos até as consequências fiscais e operacionais, com o intuito de oferecer uma visão abrangente e informativa sobre o tema. Essa análise é essencial para que empresários, advogados e demais profissionais do ramo possam tomar decisões fundamentadas e estratégicas para o sucesso de suas operações.
O Que São Contratos de Trespasse e os Contratos de Cessão de Cotas?
O Contrato de Trespasse é um instrumento jurídico que permite a venda ou transferência completa de um estabelecimento comercial, incluindo todos seus elementos materiais (como equipamentos e estoque) e imateriais (como marca, clientela e ponto comercial), de um empresário ou empresa para outro.
É essencialmente uma forma legal de vender um negócio em funcionamento. Sua nomenclatura pode parecer incomum, mas é muito provável que você já tenha visto uma placa na fachada de algum ponto comercial, dizendo: “passa-se o ponto” ou “vendo este ponto”, essa é uma das formas que se ocorre o Contrato de Trespasse.
Este tipo de contrato inclui todos os ativos necessários para operar o negócio, como os bens corpóreos, quais sejam: equipamentos, mercadorias; e os incorpóreos, que são: as marcas, patentes e clientela. Normalmente, um trespasse ocorre em situações de venda do negócio, fusão entre empresas, ou reestruturações internas.
Em contraste, o contrato de cessão de cotas se refere à transferência de participações societárias dentro de uma empresa. Neste caso, o cedente transfere seus direitos e deveres para o cessionário.
Diferente do trespasse, a cessão de cotas não implica na transferência de ativos da empresa, mas sim na mudança de quem são os donos ou sócios, o que pode impactar na governança e nas decisões estratégicas da empresa.
Aspectos Legais do Contrato de Trespasse
O contrato de trespasse, conforme estabelecido pelo Código Civil Brasileiro, refere-se à transferência completa dos ativos de um estabelecimento empresarial para um novo proprietário. Esse processo exige que o novo dono continue com a atividade econômica do negócio, prevenindo interrupções que possam prejudicar clientes, fornecedores e a estabilidade do mercado local. A legislação visa assegurar a continuidade das operações do estabelecimento, protegendo, assim, os interesses dos stakeholders envolvidos.
Além da transferência dos ativos tangíveis (corpóreos) e intangíveis (incorpóreos), o contrato de trespasse também compreende a transferência das obrigações e responsabilidades associadas ao negócio. Essas obrigações incluem dívidas, contratos e compromissos previamente assumidos pelo estabelecimento, desde que devidamente registradas nos livros contábeis. Essa disposição legal prevista no Art. 1.146 do Código Civil2 garante transparência e clareza para ambas as partes envolvidas, reduzindo riscos de litígios futuros e promovendo uma transição suave e eficiente.
Por fim, a comunicação adequada às autoridades competentes e aos principais stakeholders sobre a transferência é essencial para a regularidade do processo. O cumprimento rigoroso de todos esses aspectos legais assegura que o trespasse seja realizado de maneira justa e dentro dos parâmetros legais estabelecidos, promovendo a continuidade saudável do negócio e a segurança jurídica para todos os envolvidos.
Diferenças Fundamentais entre Trespasse e Cessão de Cotas
A principal diferença entre o trespasse e a cessão de cotas reside no objeto da transferência. No trespasse, ocorre a transferência integral do negócio, incluindo todos os ativos indispensáveis para sua operação, como equipamentos, estoque, contratos e, às vezes, até mesmo os funcionários.
Esse tipo de negociação é especialmente ideal para quem deseja adquirir um negócio existente e continuar sua operação sem interrupções.
Por outro lado, a cessão de cotas implica na alteração da composição societária de uma empresa, sem modificar diretamente sua operação. Nesse caso, ocorre a transferência das cotas sociais de um ou mais sócios para terceiros. Quem adquire as cotas assume tanto os direitos quanto às obrigações associadas a elas, incluindo eventuais dívidas e responsabilidades que possam ter sido acumuladas durante o período de participação do sócio cedente.
Dessa forma, a cessão de cotas se apresenta como uma estratégia eficaz para reestruturações internas, entrada de novos investidores ou saída de sócios, permitindo ajustes na estrutura corporativa sem afetar a continuidade operacional do negócio.
Vantagens e Desvantagens de ambos na prática
O contrato de trespasse oferece a vantagem de permitir que o negócio continue operando sem grandes interrupções, mantendo a clientela e os contratos existentes. Isto é particularmente benéfico para empresas cuja fidelidade dos clientes e estabilidade dos contratos são cruciais para seu sucesso contínuo.
Entretanto, o trespasse pode ser custoso devido às diversas obrigações legais associadas, como a necessidade de notificação e consentimento de terceiros, além de possíveis custos fiscais elevados.
Em contrapartida, a cessão de cotas se destaca por ser menos burocrática no que diz respeito à transferência de bens e ativos. Essa simplicidade pode acelerar o processo de mudança de propriedade.
No entanto, essa facilidade pode vir acompanhada de desafios significativos. A mudança de sócios, por exemplo, pode alterar o equilíbrio de poder dentro da empresa, impactando decisões estratégicas e a gestão operacional.
Ademais, o cessionário assume as responsabilidades do cedente, o que pode incluir dívidas e obrigações desconhecidas inicialmente. Por isso, é crucial realizar uma investigação detalhada e uma devida diligência antes de concluir a cessão para evitar surpresas desagradáveis.
Ambas as opções têm seus méritos e desvantagens, e a escolha entre um trespasse e uma cessão de cotas deve ser feita com base nas necessidades específicas do negócio, na situação financeira e na estrutura organizacional. O balanço entre continuação operacional, custos associados e riscos potenciais deve ser cuidadosamente ponderado para assegurar a decisão mais benéfica possível para todas as partes envolvidas.
Conclusão
Entender as diferenças entre o contrato de trespasse e o contrato de cessão de cotas é fundamental para escolher a melhor opção para cada situação empresarial. Cada um tem suas próprias vantagens e desvantagens, e a decisão deve ser tomada com base em uma análise cuidadosa das implicações legais e financeiras. Com a orientação adequada, essas operações podem ser conduzidas de maneira segura e eficaz, promovendo o crescimento e a sustentabilidade das empresas a longo prazo.
Por isso, é fundamental a consulta a um profissional experiente e de confiança, para que, durante o percurso de uma empresa, os riscos sejam minimizados por meio de um assessoramento competente.
Para aqueles que desejam aprofundar seus conhecimentos sobre contratos e suas cláusulas, a Caputo Duarte Advogados convida à leitura dos demais artigos disponíveis em seu blog e redes sociais, além de estar sempre à disposição para uma conversa mais detalhada sobre quaisquer dúvidas.
*Bianca Gomes de Freitas – Estagiária da Caputo Duarte Advogados, Graduanda em Direito pela Faculdade de Direito de Sorocaba, medalhista em olimpíadas de conhecimento, ex-estagiária em órgãos públicos e escritórios de advocacia com foco nas áreas: empresarial, cível, minerária, saúde, previdenciária entre outros.
Referências
1CAMPINHO, Sérgio. Estabelecimento empresarial. Enciclopédia Jurídica da PUC-SP,Edição 1, 2017. Disponível em:https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/236/edicao-1/estab eleciment o-empresarial. Acesso em: 30 ago. 2024.
2Brasil. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.