*Rafael Duarte
Como já abordado no último artigo publicado no blog, existem diferentes tipos de Fundos de Investimento que buscam realizar aportes em startups. Dessa forma, é essencial, para quem está inserido neste ecossistema, compreender mais a fundo as peculiaridades e características de cada um deles, com o intuito de ser ainda mais assertivo na escolha de qual tipo de investimento buscar e se ele se adequa aos objetivos de longo prazo da sua startup.
Isso se dá pelo fato de que a escolha de qual espécie funding aderir não é uma opção exclusiva do investidor; todo empreendedor precisa estar plenamente consciente das vantagens e das desvantagens do tipo de capital que ele estará buscando para expandir seus negócios. Com isso, aprofundaremos neste artigo as peculiaridades e o funcionamento dos fundos de Venture Capital e Private Equity.
FUNDOS DE VENTURE CAPITAL
O primeiro passo para se entender esse tipo de fundo é, obviamente, compreender o que se entende por Venture Capital; trata-se de uma “modalidade de investimento em que o dinheiro é aplicado em empresas jovens com expectativa de crescimento rápido e rentabilidade alta.”1 Como os aportes são feitos em empresas em fases ainda muito incipientes de desenvolvimento, é definido como um tipo de investimento de risco muito alto, o que faz com que seja traduzido como Capital de Risco, por se voltar a empreendimentos novos, mas com potencial de retornos exponenciais aos investidores.
O investidor VC (Venture Capital) entra numa etapa em que os fundadores ainda estão tentando estruturar o seu negócio, entender corretamente o seu público-alvo e definir com precisão a sua solução; são empresas que ainda não superaram o famigerado Vale da Morte.2 É justamente por isso que o investidor acaba mantendo uma parceria bastante estreita com os empreendedores, contribuindo ativamente com as suas atividades, em que a contribuição tanto financeira, quanto em smart money3 é fundamental para vencer essa etapa. 4
Dito que as empresas investidas em rodadas VC são bastante jovens, com pouco histórico, é comum que o processo de negociação seja menos moroso e burocrático que o processo do Private Equity.5 Isso porque a startup está correndo contra o tempo e o dinheiro é necessário para ela conseguir alavancar suas atividades.
Uma particularidade muito importante de rodadas VC é que o percentual de participação societária captado pelo investidor (equity share) não seja demasiado. Isso porque os fundadores precisam continuar totalmente motivados ao sucesso da empresa e uma das formas de se assegurar disso é preservar em suas mãos um percentual robusto da empresa, visto que o sucesso da startup equivalerá ao seu próprio sucesso e retorno financeiro.
Quanto ao perfil dos investidores em Venture Capital, é comum que os aportes provenham de investidores ricos, bancos de investimento e fundos de capital de risco especializados.”6 Como os riscos são muito grandes em Venture Capital, uma característica estratégica importante é a pulverização dos investimentos; ou seja, os Fundos VC costumam realizar investimentos em diversas startups, cientes de que há grandes chances de que a maioria fracasse, mas com a perspectiva de que uma delas assegure um retorno tão estrondoso, que compense as demais.7
As quatro principais vantagens que se pode contemplar do Venture Capital para as empresas investidas são: i) Proximidade entre investidor e empresa; ii) Parcerias duradouras; iii) Conselho fiscal e administrativo; e iv) Crescimento rápido e exponencial.8 Por sua vez, os 3 pontos potencialmente negativos são: i) Aumento de sócios; ii) Crescimento rápido demais; e iii) Mais pessoas envolvidas na empresa.9
O QUE SÃO FUNDOS DE PRIVATE EQUITY?
Diferentemente dos fundos de VC, os Fundos de Private Equity (PE) investem em sociedades em estágio de maturação mais desenvolvido, já com histórico rastreável de vendas, produto e público-alvo definidos, riscos projetáveis e perspectivas passíveis de cálculo de retorno e crescimento futuro.10
Os fundos verificam empresas com maior grau de robustez de estrutura, com fluxo estável e margem lucrativa11, mas com aptidão para crescimento e correção de algumas falhas operacionais ou organizacionais, que podem, naturalmente, incrementar seus resultados financeiros e garantir retornos econômicos vantajosos a seus cotistas. A principal forma visada pelos fundos de PE para garantir esse retorno é a abertura de capital da empresa, oportunidade em que o fundo aliena as suas ações e aufere o lucro decorrente da diferença entre a quantia paga para aquisição da participação e a recebida na venda.12
Ao contrário de processos de negociação mais acelerados inerentes às rodadas VC, no caso de rodadas PE, as potenciais investidas são empresas com histórico, com muito mais documentos para serem estudados, passado para ser investigado, contratos para serem analisados, o que torna o processo de negociação muito mais vagaroso e detalhado. O lado positivo, sob o prisma do investidor, é que esse aprofundamento do estudo tem o condão de lhe conferir muito mais elementos sólidos para tomar decisões devidamente aprofundadas sobre em favor de quais empresas irão destinar seus recursos.
Logicamente, os aportes são em valores muito mais expressivos, o que também faz com que haja menos rodadas PE do que rodadas VC. Para fins de comparação, relata-se que, entre os meses de janeiro e novembro de 2021, foram transacionados R$ 52,7 bilhões em Private Equity e R$ 55,2 bilhões em Venture Capital.13 Apesar de os investimentos totais serem virtualmente idênticos, tais somatórios foram obtidos mediante 643 operações de Venture Capital e 115 operações de Private Equity, denotando o oceano de distância relativo às importâncias transacionadas entre as espécies.
COMO SIMPLIFICAR A DIFERENÇA ENTRE FUNDOS DE VENTURE CAPITAL E PRIVATE EQUITY?
Com o intuito de ser bastante objetivo na distinção entre esses tipos diferentes de fundos, recorre-se a duas analogias. A primeira é da “árvore e da semente”, trazida por Renata Freitas de Camargo. Ela afirma que, no caso Venture Capital, a startup investida ainda é apenas uma semente; para que consiga se desenvolver, é fundamental que receba nutrientes e se torne uma muda. Por sua vez, no Private Equity, a startup é uma árvore – a semente cresceu e já está rendendo frutos. Nesse caso, o foco é cuidar corretamente dessa árvore para que ela siga crescendo e possa render cada vez mais frutos.
A segunda figura de linguagem é de um jogador de futebol. No caso do Venture Capital, este jogador ainda está nas categorias de base, ainda bem iniciais. Por mais que ele esteja se destacando nos campeonatos nas categorias inferiores, ele poderá virar tanto um craque no futuro, quanto um jogador apenas bom, mediano ou ruim; o futuro é logicamente incerto e os riscos são incontáveis. Investir nesse atleta é um investimento de risco inegável. No caso do Private Equity, o investimento é feito num jogador destaque da Série A do Campeonato Brasileiro. Ele pode virar um craque da Seleção e de algum time de alto nível na Europa, mas ele também pode não se aclimatar com a língua, a cultura, o frio ou qualquer outro fator fora do Brasil. Os riscos existem, obviamente, mas são bem inferiores aos riscos da aposta no garoto na categoria de base.14
QUAIS SÃO AS ETAPAS DO INVESTIMENTO POR VENTURE CAPITAL E PRIVATE EQUITY?
O primeiro esclarecimento essencial a se ter em mente é que todo e qualquer investimento em startups feito por Fundo de Investimento é realizado pensando em “como sair”. Significa dizer que quem aposta numa startup, faz isso esperando obter lucros, e isso é concretizado por meio dos chamados eventos de liquidez, ou os exits. São por meio desses eventos que o “investidor irá vender a sua participação no negócio e obterá retornos de acordo com a valorização da startup investida.”15
Há diferentes formas de exits: i) quando a startup investida é adquirida por outra empresa; ii) no caso de uma oferta pública de ações (IPO); iii) no caso de recompra da participação pelos próprios empreendedores; e iv) em nova rodada de captação da startup, em que o investidor opta por vender a sua participação para outros investidores.16
Quanto às etapas, há quem afirme que são apenas três (captação, investimento e desinvestimento), mas é possível fragmentar todo o processo em até 8 etapas, são elas: (i) Identificação; ii) Estudo ou análise; iii) Precificação; iv) Negociação; v) Due-Diligence; vi) Realização do aporte e formalização da documentação (contrato de investimento e acordo de sócios); vii) Acompanhamento; e viii) Desinvestimento.17
A decisão por aceitar o ingresso de investidores na sua startup é uma opção estratégica muito sensível, cujos detalhes precisam ser levados em consideração com atenção antes de se dar qualquer passo. Para isso, os fundadores devem colher o máximo de informações sobre o investidor com quem estão tratando e definir com a maior quantidade de detalhes os termos dessa parceria que irá se desenvolver.
A principal maneira de se fazer isso é mediante a elaboração de contratos bem concebidos e redigidos, de modo que os fundadores entrem nessa relação plenamente cientes de como ela se desenvolverá daquele momento em diante; logo, uma assessoria jurídica especializada pode representar o grande diferencial no sucesso ou não desse grande passo na jornada de uma startup.
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1VENTURE Capital: o que é e como funciona? Distrito, 2022. Disponível em: https://distrito.me/blog/venture-capital-o-que-e-e-como-funciona/#:~:text=A%20diferen%C3%A7a%20entre%20Venture%20Capital%20e%20Private%20Equity%20reside%2C%20principalmente,e%2Fou%20expans%C3%A3o%20de%20neg%C3%B3cios. Acesso em: 05 dez. 2022.
2“[…] a etapa chamada Vale da Morte, dado o elevado números de negócios que sucumbe neste estágio, caracterizado pelo momento onde a startup demanda maiores investimentos e ainda não é capaz de produzir caixa para ancorar sua necessidade de crescimento.” (BRAGA, Raphael. A travessia do Vale da Morte. Finep, 2019. Disponível em: http://www.finep.gov.br/noticias/todas-noticias/5995-a-travessia-do-vale-da-morte#:~:text=%C3%89%20a%20etapa%20chamada%20Vale,ancorar%20sua%20necessidade%20de%20crescimento. Acesso em: 27 fev. 2023).
3“Os denominados smart money são investidores que oferecem conhecimento e experiência de mercado que vão além do investimento que realizam. […] O investidor que chamamos de smart money, na grande maioria das vezes, possui experiência no mercado das startups que ele apoia. É esse know-how que permite que ele identifique uma empresa como uma boa oportunidade de investimento.” (KELLY, Greg. Smart Money: como identificar o verdadeiro para sua startup. eqseed, 2017. Disponível em: https://blog.eqseed.com/smart-money-para-startup/. Acesso em: 27 fev. 2023).
4VENTURE Capital: o que é e como funciona? Distrito, 2022. Disponível em: https://distrito.me/blog/venture-capital-o-que-e-e-como-funciona/#:~:text=A%20diferen%C3%A7a%20entre%20Venture%20Capital%20e%20Private%20Equity%20reside%2C%20principalmente,e%2Fou%20expans%C3%A3o%20de%20neg%C3%B3cios. Acesso em: 05 dez. 2022.
5VENTURE Capital: o que é e como funciona? Distrito, 2022. Disponível em: https://distrito.me/blog/venture-capital-o-que-e-e-como-funciona/#:~:text=A%20diferen%C3%A7a%20entre%20Venture%20Capital%20e%20Private%20Equity%20reside%2C%20principalmente,e%2Fou%20expans%C3%A3o%20de%20neg%C3%B3cios. Acesso em: 05 dez. 2022.
6KOVACS, Leandro. O que é venture capital? E a diferença para venture debt e private equity. TecnoBlog, 2021. Disponível em: https://tecnoblog.net/responde/o-que-e-venture-capital-e-a-diferenca-para-venture-debt-e-private-equity/. Acesso em: 05 dez. 2022.
7QUAIS as diferenças entre Private Equity e Venture Capital? Remessa Online, 2021. Disponível em: https://www.remessaonline.com.br/blog/private-equity-e-venture-capital/. Acesso em: 05 dez. 2022.
8VENTURE Capital e Private Equity: o que são e seus benefícios. Liga Insights, 2019. Disponível em: https://insights.liga.ventures/inovacao/venture-capital-e-private-equity/. Acesso em: 05 dez. 2022.
9VENTURE Capital e Private Equity: o que são e seus benefícios. Liga Insights, 2019. Disponível em: https://insights.liga.ventures/inovacao/venture-capital-e-private-equity/. Acesso em: 05 dez. 2022.
10MIRANDA, Beatriz. Diferenças entre o private equity e venture capital. Capital Aberto, 2022. Disponível em: https://capitalaberto.com.br/secoes/explicando/diferencas-entre-o-private-equity-e-venture-capital/. Acesso em: 05 dez. 2022.
11REDAÇÃO. Quais as diferenças entre Private Equity e Venture Capital? Remessa Online, 2021. Disponível em: https://www.remessaonline.com.br/blog/private-equity-e-venture-capital/. Acesso em: 05 dez. 2022.
12REDAÇÃO. Quais as diferenças entre Private Equity e Venture Capital? Remessa Online, 2021. Disponível em: https://www.remessaonline.com.br/blog/private-equity-e-venture-capital/. Acesso em: 05 dez. 2022.
13MIRANDA, Beatriz. Diferenças entre o private equity e venture capital. Capital Aberto, 2022. Disponível em: https://capitalaberto.com.br/secoes/explicando/diferencas-entre-o-private-equity-e-venture-capital/. Acesso em: 05 dez. 2022.
14REDAÇÃO. Qual a diferença entre Private Equity e Venture Capital? DxA Invest, 2021. Disponível em: https://www.dxainvest.com/post/qual-a-diferenca-entre-private-equity-e-venture-capital. Acesso em: 05 dez. 2022.
15VENTURE Capital: o que é e como funciona? Distrito, 2022. Disponível em: https://distrito.me/blog/venture-capital-o-que-e-e-como-funciona/#:~:text=A%20diferen%C3%A7a%20entre%20Venture%20Capital%20e%20Private%20Equity%20reside%2C%20principalmente,e%2Fou%20expans%C3%A3o%20de%20neg%C3%B3cios. Acesso em: 05 dez. 2022.
16VENTURE Capital: o que é e como funciona? Distrito, 2022. Disponível em: https://distrito.me/blog/venture-capital-o-que-e-e-como-funciona/#:~:text=A%20diferen%C3%A7a%20entre%20Venture%20Capital%20e%20Private%20Equity%20reside%2C%20principalmente,e%2Fou%20expans%C3%A3o%20de%20neg%C3%B3cios. Acesso em: 05 dez. 2022.
17“1. Identificação: momento em que o fundo de investimento ou investidor identifica um negócio com possibilidade de receber capital e entra em contato com os sócios. Atualmente, essa etapa também pode acontecer ao contrário, empresas, principalmente startups, entram em contato com fundos de Venture Capital. 2. Estudo ou análise: etapa em que a empresa envia as informações mais importantes do seu negócio para que os investidores analisem e entendam a rentabilidade do investimento. 3. Precificação: por meio da análise, os investidores chegam ao valor da empresa e definem a forma como será investido o capital. 4. Negociação: após definir o preço da empresa e o investimento, a etapa de negociação é onde o fundo apresenta sua proposta e ambas as partes chegam a um acordo sobre os valores e termos de contrato da operação. 5. Due-Diligence: chegando ao acordo entre empresa e investidores, passando pela aprovação do Comitê de Investimentos deste fundo, é realizado o processo de auditoria da empresa. Esse processo tem o objetivo de averiguar a existência de contingências jurídicas e financeiras e analisar questões como aspectos societários, contratuais, contenciosos etc. 6. Realização do investimento e preenchimento da documentação: após toda averiguação, os recursos são repassados para a empresa e é assinado o Contrato de Investimento, gerando um novo acordo de acionistas e deixando o fundo como sócio do negócio. 7. Acompanhamento: dependendo do que é determinado em contrato, o fundo pode acompanhar ativamente a gestão da empresa ou apenas acompanhar os resultados de crescimento. 8. Recapitalização: por fim, caso seja interesse do fundo, ele pode vender sua parte da associação para que o capital investido seja devolvido aos investidores. Na contramão, há contratos em que os investidores continuam como sócios.” (VENTURE Capital e Private Equity: o que são e seus benefícios. Liga Insights, 2019. Disponível em: https://insights.liga.ventures/inovacao/venture-capital-e-private-equity/. Acesso em: 05 dez. 2022).
*Rafael Duarte – Advogado, sócio do escritório Caputo Advogados, com atuação especializada em Startups, Estúdios de Games e Empresas de Base Tecnológica. Pós-graduando em Direito Digital e Proteção de Dados; Pós-graduado em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul; Pós-graduado em Direito Negocial Imobiliário pela Escola Brasileira de Direito; Pós-Graduado em Direito Imobiliário pela Faculdade Legale/SP; Pós-graduado em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale/SP; Mentor em programas de empreendedorismo e desenvolvimento de negócios inovadores, tais como InovAtiva Brasil, START (SEBRAE), entre outros; Diretor da Associação Gaúcha de Direito Imobiliário Empresarial (AGADIE); Membro da Comissão Direito Imobiliário da OAB/RS e Membro da Comissão de Direito Sucessório do IBDFAM/RS.