Natureza Jurídica das Contribuições para Conselhos Profissionais

Sumário

* Maria Thereza Henriques

 

 

Os conselhos de classe profissional são instituições compostas por especialistas de uma área específica, responsáveis por regulamentar, fiscalizar e orientar o exercício das profissões regulamentadas. Eles estabelecem limites de atuação, fornecem diretrizes para garantir a qualidade dos serviços prestados e realizam o registro de profissionais. A diretoria, formada por membros eleitos, atua de forma voluntária, sem remuneração, em prol dos interesses da categoria.

 

Qual é a natureza jurídica dos Conselhos Profissionais (exs.: CREA, CRM, COREN, CRO etc.)? 

Os Conselhos Profissionais possuem natureza jurídica de autarquias federais. Com exceção da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) que, segundo a concepção majoritária, é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. Com natureza jurídica de autarquia especial ou corporativa, os conselhos possuem autonomia financeira e regulatória, podendo aplicar sanções e até cancelar registros profissionais em casos de descumprimento de normas. Apesar de compartilharem funções semelhantes, cada conselho tem processos e requisitos específicos.

A estrutura é composta por um Conselho Federal e Conselhos Regionais, que representam o órgão federal em estados ou regiões. Os Conselhos Federais definem resoluções que são implementadas e reforçadas pelos Conselhos Regionais no âmbito local. Os Conselhos podem cobrar um valor todos os anos dos profissionais que integram a sua categoria. A isso se dá o nome de anuidade (art. 4º, II, da Lei nº 12.514/2011). A contribuição social devida aos conselhos regionais de fiscalização profissional tem natureza tributária conforme dispõe o art. 149, da CF/88. 

A lei nº 12.514, de 28 de outubro de 2011, em seu artigo 6º regula os limites de valor das anuidades e sua forma de reajuste para os profissionais de nível superior, técnico e pessoas jurídicas:

Art. 6º As anuidades cobradas pelo conselho serão no valor de:

I – para profissionais de nível superior: até R$ 500,00 (quinhentos reais);

II – para profissionais de nível técnico: até R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais); e

III – para pessoas jurídicas, conforme o capital social, os seguintes valores máximos:

a) até R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais): R$ 500,00 (quinhentos reais);

b) acima de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e até R$ 200.000,00 (duzentos mil reais): R$ 1.000,00 (mil reais);

c) acima de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) e até R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais): R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais);

d) acima de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) e até R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais): R$ 2.000,00 (dois mil reais);

e) acima de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) e até R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais): R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais);

f) acima de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) e até R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais): R$ 3.000,00 (três mil reais);

g) acima de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais): R$ 4.000,00 (quatro mil reais).

1º Os valores das anuidades serão reajustados de acordo com a variação integral do Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC, calculado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ou pelo índice oficial que venha a substituí-lo.

Qual a função dessa contribuição?

O valor da anuidade tem especificamente um propósito de valorização da profissão e garantia das prerrogativas profissionais, passando a ser partilhada entre o órgão superior federal e as entidades regionais.

Anualmente, os Conselhos Regionais planejam os gastos e ações do próximo ano através de planejamento orçamentário para sua organização e funcionamento. 

Com os valores arrecadados pela receita trazida pelas anuidades são pagas as despesas ordinárias e extraordinárias do Conselho tais como:

a) Proteção profissional: A principal atribuição dos conselhos é supervisionar o exercício da profissão, demandando investimentos em pessoal, logística e infraestrutura administrativa. Também são desenvolvidas parcerias estratégicas, iniciativas por concursos públicos e ações que elevam o prestígio da profissão.;

b)Infraestrutura operacional: As sedes dos conselhos funcionam como centros de deliberação e trabalho dos conselheiros voluntários. Os recursos cobrem despesas operacionais como locação, encargos condominiais e utilities básicas; e

c) Desenvolvimento da categoria: Os conselhos promovem o crescimento profissional através de capacitações, encontros e debates que fortalecem as bases da profissão e ampliam seu reconhecimento social.

 

Quando são devidas as anuidades aos conselhos?

 

O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício (art. 5º da Lei nº 12.514/2011):

 

Art. 5º O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício.

 

O processo de cobrança das anuidades pelos conselhos profissionais exige notificação formal após o lançamento de ofício. Esta comunicação permite ao profissional efetuar o pagamento ou contestar a cobrança.. Conforme julgado: 

 

As anuidades devidas aos conselhos profissionais estão sujeitas a lançamento de ofício, que apenas se aperfeiçoa com a notificação do contribuinte para efetuar o pagamento do tributo e o esgotamento das instâncias administrativas, em caso de recurso, sendo necessária a comprovação da remessa da comunicação.

STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 2.133.371-SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 17/6/2024 (Info 19 – Edição Extraordinária).

A legislação mantém certa flexibilidade quanto ao meio de notificação, não estabelecendo um formato específico. No entanto, caso o pagamento não seja realizado, o processo segue para uma nova fase: a execução fiscal. Esta execução ocorre necessariamente na Justiça Federal, conforme estabelecido pela Súmula 66 do Superior Tribunal de Justiça, devido à natureza federal das autarquias profissionais.

Para ilustrar, considere o seguinte exemplo hipotético: João, inscrito no Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo, deixou de pagar as anuidades referentes aos anos de 2012 a 2014. Diante do atraso, o Conselho realizou o lançamento de ofício dos valores devidos e ajuizou uma execução fiscal para cobrar o débito. O Juiz Federal, entretanto, determinou que o Conselho, no prazo de 15 dias, apresentasse comprovação de que João havia sido notificado sobre as anuidades cobradas. Como o Conselho não apresentou essa comprovação, o juiz extinguiu a execução fiscal, entendendo que a Certidão de Dívida Ativa não atendia aos requisitos de liquidez e certeza exigidos para o título executivo.

O mesmo entendimento se aplica às pessoas jurídicas. Ao optar pelo registro voluntário em um conselho de fiscalização profissional, o inscrito realiza o fato gerador e passa a ter a obrigação de pagar as anuidades. Com base nessa interpretação, a Turma Regional de Uniformização (TRU) dos Juizados Especiais Federais (JEFs) da 4ª Região rejeitou o pedido de uma empresa de Santa Catarina que pleiteava a inexigibilidade do pagamento de anuidade ao Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio Grande do Sul, alegando não exercer atividade privativa de veterinária.

Segundo a relatoria do juiz federal Rodrigo de Souza Cruz, “ainda que não estejam obrigadas à inscrição, as pessoas jurídicas que não realizam atividades privativas devem pagar as anuidades ao conselho onde se registraram voluntariamente, conforme a previsão expressa do artigo 5º da Lei nº 12.514/11”.

A decisão, tomada de forma unânime na sessão de 21 de junho, estabeleceu a seguinte tese vinculante para os JEFs da 4ª Região: mesmo que não haja obrigação de registro no conselho de fiscalização profissional ou de contratação de profissional habilitado, o registro voluntário na entidade implica a obrigação de pagar as anuidades, configurando o fato gerador previsto no artigo 5º da Lei nº 12.514/11, norma aplicável tanto às pessoas físicas quanto jurídicas.

 

Qual é a natureza jurídica dessas anuidades? 

 

De acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), as anuidades cobradas pelos conselhos profissionais são classificadas como tributos do tipo “contribuições de interesse das categorias profissionais”, conforme previsto no artigo 149 da Constituição Federal de 1988. Essa posição foi reafirmada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4697/DF, relatada pelo Ministro Edson Fachin e julgada em 6 de outubro de 2016.

O entendimento consolidado pelo STF é acompanhado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo o STJ, as anuidades devidas a esses conselhos devem ser lançadas de ofício, sendo imprescindível a notificação do contribuinte para o pagamento e o esgotamento das instâncias administrativas caso haja recurso. Além disso, exige-se a comprovação de que a notificação foi devidamente enviada ao contribuinte. Esse entendimento foi reforçado na decisão da 2ª Turma do STJ no julgamento do AgInt no AREsp 1689783/RS, relatado pelo Ministro Francisco Falcão, em 26 de outubro de 2020.

Em conformidade com essa orientação, o STJ manteve tanto a sentença de primeiro grau quanto o acórdão do Tribunal Regional Federal (TRF), ressaltando que a validade do lançamento de ofício depende da notificação do contribuinte e do respeito ao processo administrativo. Essa posição está alinhada ao precedente estabelecido no REsp 1.788.488/RS, relatado pelo Ministro Og Fernandes, publicado no DJe de 8 de abril de 2019.

 

Conclusão

Os Conselhos Profissionais desempenham um papel crucial na regulação, fiscalização e valorização das profissões regulamentadas no Brasil. Suas anuidades, classificadas como tributos na forma de contribuições de interesse das categorias profissionais, têm como objetivo sustentar a estrutura e as atividades desses conselhos, garantindo a qualidade dos serviços prestados e a valorização das categorias representadas. Contudo, a exigência do pagamento dessas contribuições está condicionada à observância rigorosa de procedimentos administrativos, como o lançamento de ofício e a notificação ao contribuinte, reforçando a importância do respeito às normas jurídicas e aos direitos dos profissionais.

Diante da complexidade das obrigações envolvendo Conselhos Profissionais, é essencial contar com suporte jurídico especializado. O escritório Caputo Duarte Advogados, com ampla experiência em Direito Tributário e Empresarial, oferece assessoria completa para profissionais, empresas e entidades. Entre em contato e conte com nossa expertise para garantir segurança jurídica em suas relações com os Conselhos Profissionais e em outras demandas legais.

 

 

 

 


 

*Maria Thereza Henriques, estagiária no Caputo Duarte Advogados Associados, assessoria empresarial full service com ênfase em Startups e Estúdios de Games. Bacharela em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

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Referências

CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Informativo 19-STJ (EDIÇÃO EXTRAORDINÁRIA). DizerDireito, 2024. Disponível em: https://dizerodireito.net/wp-content/uploads/2024/08/info-19-stj-edicao-extraordinaria.pdf. Acesso em: 26 de dez. 2024.

 

Indeed. O que é conselho profissional e qual sua importância. Indeed Brasil, 2023. Disponível em: https://br.indeed.com/conselho-de-carreira/desenvolvimento-de-carreira/conselho-profissional. Acesso em: 26 de dez. 2024.

 

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO. Pessoa jurídica inscrita em conselho profissional deve pagar anuidade. TRF4 | Juizados – TNU, 01 jul. 2024. Disponível em: https://www.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=noticia_visualizar&id_noticia=28292. Acesso em: 26 de dez. 2024.

 

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