* Maria Thereza Henriques
O mercado de trabalho moderno exige frequentes movimentações e uma tendência emergente captura tanto a necessidade de segurança financeira quanto o desejo de autorrealização: o polywork, ou politrabalho.
A prática que foi sendo implementada pelos millennials agora é a principal opção para a geração Z, que busca novas formas de ampliar a carreira. A Geração Z, composta por aqueles nascidos a partir de 1997, está cada vez mais adotando a prática de trabalhar simultaneamente em dois empregos para aumentar seus ganhos. Estes jovens, agora na faixa dos vinte anos, estão ingressando em uma fase de maior maturidade no mercado de trabalho e buscando maneiras de maximizar suas rendas.
Os trabalhos temporários eram as alternativas mais tradicionais para os profissionais que buscavam complementar sua renda, todavia, atualmente, o polywork se demonstra mais popular para captação de recursos financeiros e também como uma oportunidade de explorar mais caminhos e ambições.
No Brasil, essa tendência vem se acelerando, com profissionais de diferentes áreas optando por cultivar múltiplas habilidades e engajar-se em vários empregos. Este fenômeno demonstra a demanda por uma resposta às incertezas econômicas e também simboliza um passo em direção a um trabalho mais autêntico e alinhado com os valores individuais.
Como é definido o “polywork”?
O termo “polywork” é designado para a prática de ter vários vínculos em trabalhos e/ou projetos concomitantemente. Eles podem ou não se relacionar. Ao contrário de ter um único emprego fixo ou realizar trabalhos extras esporádicos, o polywork envolve a diversificação das atividades profissionais.
Nota-se que o público praticando do polywork busca uma carreira mais abrangente e capaz de desenvolver habilidades em vários campos. As opções são diversas para os profissionais que se adequam às diversas frentes, tais como: freelancer, consultorias, projetos criativos, ou até iniciativas empreendedoras. Essa metodologia oferece mais flexibilidade e a oportunidade de construir uma carreira multifacetada, possibilitando maior alinhamento com as aspirações pessoais e profissionais a longo prazo.
Ainda que com as diversas possibilidades e vantagens, para obter sucesso na metodologia do polywork é necessário ter uma excelente gestão de tempo, além de um equilíbrio que evite o burnout. Ter sucesso no polywork exige a habilidade de equilibrar diversas tarefas sem afetar a excelência do trabalho ou a saúde mental. Desenvolver competências organizacionais e estabelecer limites definidos são vitais para sustentar a eficiência e o bem-estar ao lidar com múltiplas responsabilidades.
A CLT prevê o polywork ?
O polywork não infringe a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) no Brasil, porém é necessário se atentar para a forma como ele é realizado. Os trabalhadores contratados sob o regime da CLT têm o direito de realizar atividades adicionais, desde que essas não interfiram com suas responsabilidades perante o empregador principal. A CLT em seu artigo 482 prevê que: “desídia no desempenho das respectivas funções” pode ser motivo de demissão por justa causa, o que abrange situações onde o empregado negligencia suas funções devido a compromissos com outros trabalhos.
É crucial também considerar questões de conflito de interesses, tais como concorrência e aliciamento de clientes. Se o(s) vínculo(s) alternativos representam um conflito direto com as atividades da empresa principal, como trabalhar para um concorrente, isso pode ser considerado uma violação do contrato de trabalho conforme a CLT.
Também é necessário um cuidado com relação às horas de trabalho. A CLT estabelece limites para a jornada semanal e exige o pagamento de horas extras para jornadas que ultrapassam esses limites. Profissionais sob o regime CLT que desejam se envolver em atividades adicionais precisam gerenciar suas horas para garantir que não estão violando esses regulamentos e evitando possíveis problemas legais. Além disso, é importante observar as regras sobre intervalos e descanso semanal, assegurando que o trabalho adicional não interfira no tempo necessário para repouso e recuperação. Profissionais CLT devem considerar a transparência e comunicação com seus empregadores sobre quaisquer atividades adicionais.
Muitos profissionais que adotam o polywork fazem isso por meio de trabalhos autônomos ou freelancers. Essas formas de trabalho não são reguladas pela CLT, mas por outras legislações, como o Código Civil, dependendo do tipo de serviço prestado. Esses profissionais podem negociar diretamente com seus clientes, personalizando serviços e condições de pagamento. No entanto, é essencial que freelancers e autônomos estejam cientes das obrigações fiscais e legais associadas a essa forma de trabalho, como a necessidade de emitir notas fiscais e contribuir para a previdência social. A diversificação dos projetos e clientes, característica do polywork, pode proporcionar uma renda mais variada e a oportunidade de desenvolver um portfólio abrangente e diversificado.
Fatores que Contribuem para a Popularidade do Polywork
O aumento da popularidade do polywork pode ser atribuído a várias tendências sociais, econômicas e tecnológicas contemporâneas. Avanços tecnológicos facilitaram o acesso a oportunidades de trabalho remoto, freelance e projetos paralelos, permitindo maior flexibilidade na realização das tarefas. Além disso, mudanças no mercado de trabalho, como a gig economy1 e a demanda por habilidades diversificadas, incentivam as pessoas a explorar diferentes carreiras e desenvolver competências que aumentem sua empregabilidade.
A busca por segurança financeira também impulsiona o polywork, pois muitos veem na diversificação das fontes de renda uma maneira de criar uma rede de segurança mais robusta diante da incerteza econômica. Além disso, a prática permite que as pessoas alcancem maior satisfação pessoal e profissional, explorando diferentes interesses e paixões que alinhem seu trabalho com seus valores e objetivos de vida.
Outro fator é o desejo por um melhor equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. O polywork oferece flexibilidade para configurar horários de trabalho conforme as necessidades pessoais. Além disso, a crescente cultura de empreendedorismo e inovação estimula as pessoas a iniciar seus próprios projetos ou startups, utilizando o polywork como uma estratégia para desenvolver negócios enquanto mantêm outras fontes de renda.
O Impacto do Polywork nas Empresas
Por outro lado, o polywork também apresenta desafios significativos. Um dos maiores riscos é o potencial conflito de interesses, especialmente se o trabalhador estiver envolvido em projetos ou empresas concorrentes. Isso pode levar a questões éticas e de segurança da informação. Além disso, o polywork pode causar uma divisão de atenção e produtividade. Se não gerenciado corretamente, essa prática pode levar a uma divisão na atenção do trabalhador, afetando sua produtividade e desempenho no trabalho principal. Outro desafio é o comprometimento e disponibilidade. Colaboradores muito envolvidos em múltiplas atividades podem não estar disponíveis quando necessário, especialmente em situações que exigem um comprometimento adicional ou horas extras.
Em resumo, o polywork pode ser uma estratégia benéfica para empresas que sabem gerenciar bem essa prática, maximizando suas vantagens e mitigando seus desafios. A chave é encontrar um equilíbrio que permita aproveitar os benefícios da diversidade de habilidades e experiências dos colaboradores, sem comprometer a produtividade e a lealdade no trabalho principal.
Como a empresa pode apoiar os profissionais polywork?
As empresas podem apoiar profissionais que praticam o polywork de várias maneiras. Uma abordagem inicial eficaz é implementar políticas claras que definam limites e expectativas para o trabalho externo, ajudando a evitar conflitos de interesse e garantindo que as responsabilidades principais dos funcionários não sejam comprometidas. Além disso, oferecer horários de trabalho flexíveis ou a opção de trabalho remoto permite que os funcionários organizem melhor seu tempo entre múltiplos compromissos, contribuindo para a satisfação geral, produtividade e lealdade à empresa.
Promover uma cultura de comunicação aberta é igualmente importante. Incentivar os funcionários a discutir seus projetos paralelos ajuda os gestores a entender melhor as demandas enfrentadas pelos times e a identificar possíveis áreas de conflito. Reconhecer e integrar as habilidades adicionais adquiridas em projetos externos pode trazer novas perspectivas e inovações para a organização. Investir em desenvolvimento profissional contínuo por meio de treinamentos, workshops e oportunidades de aprendizado também é valioso, beneficiando tanto o crescimento individual dos profissionais quanto a gama de habilidades disponíveis para a empresa.
Para manter um ambiente de trabalho saudável que apoie o polywork, as empresas devem realizar avaliações regulares do bem-estar dos colaboradores. O polywork pode levar ao estresse e ao esgotamento se não for gerenciado corretamente. Fornecer recursos de apoio à saúde mental e física, e garantir que os profissionais não estejam sobrecarregados, são etapas essenciais. Além disso, elaborar contratos claros e em conformidade com as legislações trabalhistas vigentes é fundamental para evitar problemas com os funcionários. Estabelecer políticas internas claras e realizar auditorias regulares para garantir a conformidade são práticas recomendadas. Nossa equipe de especialistas na Caputo Advogados Associados está pronta para ajudar a sua empresa a manter um ambiente de trabalho justo e legalmente seguro.
*Maria Thereza Henriques, estagiária no Caputo Advogados Associados, assessoria empresarial com ênfase em Startups e Estúdios de Games. Bacharelanda em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
Referências
Rabello, Guilherme. “Polywork: o que é e por que está acontecendo esse fenômeno?” Siteware Blog, 02 de maio de 2024. Disponível em: https://www.siteware.com.br/blog/gestao-de-equipe/polywork/
Siani, Phelipe. “Polywork: nome chique que a geração Z deu pra rotina do pai do Chris.” CNN Brasil, 17 de abril de 2024. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/phelipe-siani/lifestyle/polywork-nome-chique-que-a-geracao-z-deu-pra-rotina-do-pai-do-chris
TRAVASSOS, Flavia. Polywork: Número de brasileiros que trabalham em dois empregos cresce 15% em 10 anos, segundo PNAD. SBT News, 2024. Disponível em: https://sbtnews.sbt.com.br/noticia/economia/polywork-numero-de-brasileiros-que-trabalham-em-dois-empregos-cresce-15-em-10-anos-segundo-pnad.
1“A Gig Economy é o ambiente de negócios em que há intermediação de trabalho humano por meio de plataformas digitais, no qual prevalecem contratos flexíveis, de curta duração e cujo pagamento dos trabalhadores se dá por tarefas realizadas. Nessa relação, as plataformas digitais podem intermediar diferentes tipos de trabalho”. Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da FGV Direito SP