Revolução dos Pagamentos: IPs democratizam o acesso a Serviços Financeiros

Sumário

Por Ana Laura Finati Alves*

 

 

Introdução

O panorama financeiro brasileiro se encontra em plena transformação, impulsionado pelo crescimento exponencial das Fintechs. Essas empresas inovadoras desafiam o modelo tradicional dos bancos, democratizando o acesso a serviços financeiros, impulsionando a inclusão financeira e promovendo a digitalização da economia.

Diversos fatores contribuem para esse cenário, tais como as taxas elevadas de bancos tradicionais, a geração emergente ávida por soluções tecnológicas e a agilidade proporcionada pelas Fintechs. 

No Brasil, temos duas categorias de fintechs que estão sujeitas à regulação do Banco Central: as Fintechs de Crédito, que realizam operações de crédito e as Instituições de Pagamento (IPs). O presente artigo se propõe a analisar o segundo grupo.

As Instituições de Pagamento (IPs) assumem um papel fundamental nesse cenário. Autorizadas pelo Banco Central do Brasil (BCB ou BACEN) a realizar serviços de pagamento, como gerenciamento de conta, depósito e emissão de moeda eletrônica, as IPs têm crescido exponencialmente, demonstrando o interesse cada vez maior do mercado nesse modelo de negócio. 

A regulamentação brasileira é dita como uma das mais favoráveis na América Latina nesse ramo, em decorrência da Circular n.º 3.885 do BCB, que inaugurou um espaço altamente sólido para o avanço das Fintechs.

Impulsionado por um cenário promissor no Brasil, mentes brilhantes e investidores visionários buscam o país como referência para crescer e inovar no setor. Segundo dados da Associação Brasileira de Fintechs (ABFIntechs), em janeiro do corrente ano de 2024, esse pujante ecossistema já contava com 1.481 empresas ativas1, sedimentando ainda mais o país como referência no continente.

Neste sentido, as IPs representam uma força transformadora no cenário financeiro brasileiro, impulsionando a inclusão, a inovação e, principalmente, a competitividade do setor. Portanto, as Instituições de Pagamento expressam uma boa alternativa de investimento, uma vez que são mais acessíveis e menos burocráticas que uma Fintech de crédito.

 

Papel das Instituições de Pagamento (IPs)

 

De acordo com o próprio Banco Central do Brasil2, a IP (Instituição de Pagamento) é uma pessoa jurídica não financeira, cujo objetivo é viabilizar os serviços de compra e venda e de movimentação de recursos no âmbito dos arranjos de pagamento.

 

As IPs permitem, dessa forma, que uma pessoa física ou jurídica faça pagamentos mesmo sem ter relações com as instituições bancárias/financeiras, portanto, o papel dela é deixar a operação muito mais fluida e rápida.

Essas instituições são supervisionadas pelo Banco Central, assim como as outras, e, necessariamente, precisam constituir Sociedades Empresárias Limitadas (LTDA) ou Anônimas (S.A) para operar.

Os principais serviços que podem ser oferecidos pelas IPs são3:

  1. Disponibilizar serviço de aporte ou saque;
  2. Gerir conta de pagamento;
  3. Executar ou facilitar instrução de pagamento;
  4. Emitir ou credenciar a aceitação de instrumento de pagamento;
  5. Executar remessa de fundos;
  6. Converter moeda física ou escritural em moeda eletrônica, ou vice-versa;
  7. Credenciar a aceitação ou gerir o uso de moeda eletrônica; e
  8. Iniciar transações de pagamento no âmbito de arranjos de pagamentos.

Apesar disso, essas operações não são exclusivas das IPs, pois as cooperativas de crédito, bancos, financeiras, etc., também são autorizadas a realizá-las. Contudo, a IP não é autorizada pelo BCB a realizar empréstimos e financiamentos, limitando-a nos serviços descritos acima.

 

Tipos de Instituições de Pagamento

Ainda, as IPs são divididas em tipos, consoante aos serviços que oferecem. Atualmente são 4 (quatro) tipos de Instituições presentes e autorizadas pelo Banco Central do Brasil4. É necessário ressaltar que uma modalidade não exclui a atuação em outra, isto é, uma mesma instituição poderá atuar em mais de um tipo, sem qualquer restrição. Portanto, são eles: 

Emissor de Moeda Eletrônica: Faz o gerenciamento de uma conta de pagamento no qual os recursos precisam ser depositados previamente, nesse caso, cartões pré-pagos se encaixam perfeitamente nessa categoria.

Emissor de Instrumento de Pagamento Pós-Pago: Faz a gestão de uma conta de pagamento pós-paga, onde os valores são depositados para fazer a quitação de dívidas, como instituições emissoras de cartão de crédito.

Credenciador: Autoriza comércios para aceitar pagamentos, sem realizar a gestão de contas de pagamento de usuários. Por exemplo, o fornecedor de maquininhas de cartões.

Iniciador de Transação de Pagamento: Realiza transação de pagamento, mas não executa a gestão da conta de pagamento e também não possui os valores usados nas operações financeiras, como é o caso da instituição que realiza pagamentos ou transferências, sem ter acesso ao ambiente da instituição ou cartão, no qual tem a referida conta. 

 

Legislação Competente

Ao que pesa a lei vigente que regula esses tipos de instituições, temos, principalmente, a Lei n.º 12.865 de 2013 (Lei dos Meios de Pagamento), que não somente trata diretamente sobre arranjos de pagamento e as instituições de pagamento que fazem parte do Sistema de Pagamentos Brasileiro, mas foi a legis que introduziu tudo, abrindo caminho para a criação das instituições de pagamento (IPs).

Originada da MP 615/2013, essa legislação surgiu devido à lacuna regulatória sobre instituições de pagamento, visando incentivar novos agentes no mercado para promover concorrência, reduzir custos, ampliar escolhas dos consumidores e melhorar serviços, além de abordar riscos associados às atividades de pagamento. 

Ademais, essa Lei estabeleceu para o BACEN o necessário mandato legal que legitima a sua atuação, com isso, ele possui uma grande lista de poderes, que vai desde regular e autorizar a atuação das instituições, até supervisionar os arranjos de pagamento e os agentes de mercado, sempre observando os parâmetros trazidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN)5.

Por fim, outros quatro regulamentos que precisam ser citados, são:

  1. Circular 3.680, de 4 de novembro de 2013, que trouxe as modalidades de conta de pagamento usadas para registros de transações de pagamento; 
  2. Circular 3.683, de 4 de novembro de 2013, que determinou as regras e processos para a autorização de operações, mudanças de controle e reorganizações societárias, cancelamento, etc.;
  3. Circular n° 3.885, de 26 de março de 2018, que aplicou novas regras para as IPs, principalmente no que tange as condições para o exercício de cargos de administração e autorização para essa prestação de serviços; e 
  4. Resolução BCB n° 80, de 25 de março de 2021, que disciplina a constituição e o funcionamento das instituições de pagamento.

Instituições de Pagamento vs Arranjos de Pagamento vs Instituições Financeiras

Como bem se desenvolveu neste artigo, as IPs possuem uma série de especificações, que podem, ou não, ser compartilhadas com as Instituições Financeiras, ou, ainda, que a IP está inserida no contexto dos Arranjos de Pagamento. Por isso, ter a distinção de cada uma é essencial para compreender o verdadeiro sentido dessa inovação financeira e iremos te ajudar nessa missão.

No item II conceituamos as IPs, entretanto, reforça-se que, essencialmente, elas  caracterizam-se por viabilizar as operações de pagamento para indivíduos, sem o uso direto de uma conta bancária, dispensando, portanto, a intermediação de instituições financeiras como bancos comerciais. 

Já o Arranjo de Pagamento, designado no art. 6 da Lei 12.865/13, determina-se como conjunto de regras e procedimentos que disciplina a prestação de determinado serviço de pagamento ao público. As regras do arranjo facilitam as transações financeiras que usam dinheiro eletrônico.6 O arranjo, em sua essência, atua como um elo conector entre todas as partes que compõem o fluxo da transação financeira. Dessa forma, propicia um ambiente seguro, prático e permeado por diversas modalidades de pagamento, colocando-as à disposição do público.

As IFs, ou Instituições Financeiras, configuram-se como instituições públicas ou privadas que operam como intermediário entre a clientela, composta por pessoas físicas e jurídicas, e os serviços inerentes ao mercado. A elas cabe a responsabilidade pela gestão desses serviços, os quais se traduzem em um leque abrangente de opções à disposição da população. Os bancos tradicionais estão alocados nessa categoria.

Para elucidar essa diferenciação, segue tabela ilustrativa com as principais distinções entre eles:

 

Instituições de Pagamento Instituição Financeira Arranjo de Pagamento
Oferece ao cliente uma conta de pagamento; Apenas conta corrente ou poupança; É composto pelas normas que possibilitam a execução dos serviços, basicamente, é uma tecnologia que viabiliza as transações de pagamento.
Não pode oferecer empréstimos e financiamentos; Pode oferecer empréstimos e financiamentos;
Tipos: emissor de moeda eletrônica, emissor de instrumento pós-pago, credenciador e iniciador de transação de pagamento; Tipos: cooperativas de crédito e financeiras, empresas hipotecárias, bancos tradicionais, de investimentos, etc.
É uma empresa que oferta serviços de compra e venda e de movimentação de valores.

 

Requisitos para constituir uma IP

Para atuar nesse ramo financeiro, as regras na qual essa empresa deve-se enquadrar estão dispostas nas legislações competentes, contudo, detalhamos uma pequena lista para guiá-los nessa decisão:

  • Constituir-se em uma Sociedade Limitada (LTDA)7 ou Anônima (S.A.);
  • Possuir o objeto social entre os listados no art. 6º, inciso III, da Lei 12.865/13, como, por exemplo: disponibilizar serviço de aporte ou saque de recursos mantidos em conta de pagamento, executar remessa de fundos, emitir instrumento de pagamento, entre outros;
  • Possuir a expressão instituição de pagamento na sua denominação social;
  • Divulgar em seus canais essa mesma nomenclatura de maneira clara;
  • Divulgar os serviços de pagamento oferecidos em seu site;
  • Adotar política de governança e compliance, autorizada pelo conselho de administração ou pela diretoria da instituição, visando garantir o cumprimento da regulamentação que regula essas instituições, como política de segurança cibernética, política para prevenção de lavagem de dinheiro, política anticorrupção, etc.;
  • Solicitar permissão do Banco Central do Brasil para oferecer serviço de pagamento, cumprindo as regras previstas em lei pela legislação, a depender de sua modalidade, são essas: emissor de moeda eletrônica, iniciador de transação de pagamento e operador de câmbio;
  • Integralizar e manter o capital mínimo, que dependerá de sua modalidade. No caso concreto, será de um milhão de reais para a IP que realiza a iniciação de transação de pagamento e dois milhões de reais para as demais.

 

Outro ponto importante de menção é a possibilidade de controle, parcial ou integral, das IPs por capital estrangeiro. Portanto, ainda que se trate de investidor estrangeiro, as únicas informações levadas em consideração pelo BCB são puramente reputacionais, dados cadastrais, e demais nesse sentido.

 

Conclusão

 

Tendo o conhecimento da expansão desse mercado e as possibilidades que advêm dessas inovações, é imperioso planejar-se com muita cautela e sempre com a devida orientação jurídica.

 

Empresas como Stone, Cielo., PagSeguro, NU Pagamentos, Assas, PayPal, Dock, entre outras, exploraram esse ramo e se desenvolveram infinitamente, sabendo aproveitar muito bem todo o escopo e perspectiva que as Instituições de Pagamento trazem consigo.

 

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*Ana Laura Finati Alves – Estagiária no Escritório Caputo Duarte Advogados. Graduanda em Direito pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel); Atuação em projetos de escrita científica com foco em direito trabalhista e empresarial; Estágio nos setores de Recurso Humanos e Trabalhista em escritório de Contabilidade; Estágio em escritório de advocacia nos setores Trabalhista e Empresarial; Estágio no Caputo Duarte Advogados, assessoria empresarial especializada em startups e empresas de base tecnológica.

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Referências

Como se tornar Instituição de Pagamento no Brasil? Saiba como ser uma IP, 2022. Disponível em: https://dock.tech/fluid/blog/banking/como-se-tornar-instituicao-pagamento/.  Acesso em: 22 jun. 2024.  

KRUGER, Eduardo. Instituição de pagamento: o que é e como funciona?, 2024. Disponível em: https://blog.asaas.com/instituicao-de-pagamento/. Acesso em: 22 jun. 2024. 

O crescimento exponencial das fintechs no Brasil, 2024. Disponível em: https://paysmart.com.br/crescimento-fintechs-no-brasil/. Acesso em: 21 jun. 2024. 

OLIVAL, Larissa. Crescimento exponencial dos aplicativos de fintechs: tendências e oportunidades em 2023 Larissa Olival/Adjust, 2023. https://finsidersbrasil.com.br/opinioes-e-artigos-fintechs/crescimento-exponencial-dos-aplicativos-de-fintechs-tendencias-e-oportunidades-em-2023-larissa-olival-adjust/. Acesso em: 22 jun. 2024. 

NETO, Eduardo Salomão. A Lei 12.865/13 e as novas atividades “bancárias” das instituições de pagamento, 2020. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/lei-12865-novas-atividades-bancarias-instituicoes-pagamento-13102020. Acesso em: 22 jun. 2024. 

 

1O crescimento exponencial das fintechs no Brasil. PaySmart, 2024. Disponível em: https://paysmart.com.br/crescimento-fintechs-no-brasil/. Acesso em 21 jun. 2024.

2Banco Central do Brasil, 2023. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/meubc/faqs/p/o-que-e-uma-instituicao-de-pagamento-ip. Acesso em 21 jun. 2024.

3Banco Central do Brasil, 2023.  Disponível em: https://www.bcb.gov.br/meubc/faqs/p/quais-servicos-de-pagamento-podem-ser-prestados-pela-instituicao-de-pagamento. Acesso em 21 jun. 2024.

4Banco Central do Brasil, 2023.  Disponível em: https://www.bcb.gov.br/meubc/faqs/p/quais-sao-os-tipos-de-instituicoes-de-pagamento. Acesso em 21 jun. 2024.

5MELLO, João Manoel Pinho; MOURÃO, Ricardo T. Leite. Jota. 2020. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/lei-12865-nascimento-evolucao-aplicacao-21102020. Acesso em 22 jun. 2024.

6Banco Central do Brasil, 2023. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/arranjospagamento. Acesso em: 22 jun. 2024

7O Contrato Social que rege a Sociedade Limitada constituída como instituições de pagamento deverá estabelecer mandato de duração não superior a quatro anos para o administrador, cuja recondução é admitida. Ademais, a administração da Sociedade deverá ser exercida por, no mínimo, três administradores.

 

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